Ainda me lembro do dia em que decidi abrir meu primeiro negócio. Era 2018, estava desempregada há seis meses e com as contas se acumulando. Aquele momento de desespero acabou se transformando na melhor decisão da minha vida. E não estou sozinha nessa jornada.
No Brasil atual, o empreendedorismo feminino tem crescido de forma impressionante. Conforme acompanho de perto esse movimento, percebo que não é apenas uma questão de sobrevivência econômica – é uma revolução silenciosa que está redefinindo o mercado de trabalho brasileiro.
Os números não mentem. Segundo o SEBRAE, já somos mais de 10 milhões de mulheres empreendedoras, representando 34% do total de empreendedores no país. E, mesmo diante de uma pandemia devastadora, muitas de nós encontramos no empreendedorismo uma tábua de salvação.
O que realmente me emociona ao trabalhar com mulheres empreendedoras é a resiliência. Tenho visto mães solo transformando habilidades caseiras em negócios lucrativos, executivas cansadas de bater no teto de vidro que abrem suas próprias empresas, jovens que desafiam setores tradicionalmente masculinos.
Por que tantas mulheres estão empreendendo?
Ao conversar com dezenas de empreendedoras para este artigo, identifiquei motivações que vão muito além do dinheiro:
- A possibilidade de determinar o próprio horário e estar presente na vida dos filhos
- O desejo profundo de independência financeira e emocional
- A frustração com ambientes corporativos que não valorizam talentos femininos
- A necessidade urgente de renda após perdas de emprego
- A vontade de criar soluções para problemas que vivenciaram
Uma pesquisa do IBGE que analisei recentemente revelou algo fascinante: enquanto 43% das mulheres começam a empreender por necessidade, 57% o fazem por identificar oportunidades reais. Isso me mostra que, mesmo quando pressionadas por circunstâncias difíceis, conseguimos enxergar potencial onde outros veem apenas desafios.
Lembro-me da Fernanda, confeiteira que conheci em um evento para empreendedoras. Ela começou fazendo bolos na pandemia porque perdeu o emprego de secretária. “Comecei por desespero, mas descobri uma paixão que nunca imaginei ter. Hoje tenho três funcionárias e não voltaria para o CLT nem por um salário triplo”, me contou enquanto trocávamos cartões.
Obstáculos que ainda enfrentamos no empreendedorismo
Não quero dourar a pílula – empreender sendo mulher no Brasil ainda é como nadar contra a corrente. Em minhas mentorias com empreendedoras iniciantes, sempre alerto para os desafios que provavelmente enfrentarão:
- Dificuldade para acessar crédito e investimento (já tive três pedidos de empréstimo negados antes de conseguir um)
- Redes de contato mais restritas ou masculinas
- Preconceito explícito em negociações e parcerias
- A eterna dupla ou tripla jornada (empresa, casa, filhos)
- Insegurança em áreas como finanças e precificação
Um dado que sempre me indigna: apenas 2,9% do capital de risco global vai para empresas fundadas exclusivamente por mulheres, segundo a Statista. Já tentei levantar investimento para minha empresa de tecnologia e sei na pele como é difícil ser levada a sério em uma sala cheia de investidores homens.
No Brasil, o SEBRAE aponta que 68% das mulheres empreendedoras enfrentam barreiras para obter financiamento, contra 52% dos homens. E não, não é porque somos “mais emocionais” ou “menos preparadas” – os vieses inconscientes no sistema financeiro são reais e documentados.
Áreas promissoras para mulheres empreendedoras
Apesar dos obstáculos, tenho visto oportunidades brilhantes em diversos setores:
- Economia criativa (conheci uma designer que fatura R$30 mil mensais com identidades visuais)
- Saúde e bem-estar (uma amiga nutricionista transformou consultas online em um negócio escalável)
- Educação (especialmente cursos e mentorias online)
- Alimentação (do delivery caseiro às foodtechs)
- Tecnologia e inovação (contrariando todos os estereótipos)
- Sustentabilidade e impacto social (uma paixão cada vez mais feminina)
Quando acompanho o mercado de tecnologia, os números me deixam otimista mesmo sendo ainda desafiadores. Mulheres representam apenas 20% da força de trabalho em TI, mas as startups fundadas por nós geram, em média, 35% mais retorno sobre o investimento, segundo a McKinsey.
Em minhas palestras, sempre digo: “Não deixe que digam que tecnologia não é para mulheres – alguns dos melhores códigos que já vi foram escritos por programadoras”.

Como superar as barreiras e fazer seu negócio decolar
Depois de errar muito e aprender ainda mais, compilei algumas estratégias que realmente funcionam:
- Desenvolva um modelo de negócio que resolva dores reais (e não apenas “mais um produto bonitinho”)
- Busque mentoria com quem já esteve onde você quer chegar
- Cultive uma rede de apoio profissional e pessoal (não dá para fazer tudo sozinha)
- Abrace a tecnologia mesmo que pareça assustadora no início
- Aprenda o básico de finanças – conhecer seus números é libertador!
- Conecte-se com outras empreendedoras – a competição deu lugar à colaboração
- Procure programas específicos para mulheres (já participei de três e foram transformadores)
Uma dica valiosa que sempre compartilho: o programa Mulher Empreendedora do SEBRAE oferece capacitações gratuitas pensadas especificamente para nós. Foi lá que aprendi a precificar corretamente meus serviços pela primeira vez: SEBRAE Mulher Empreendedora.
Financiamento: onde encontrar recursos para seu negócio
A pergunta que mais recebo em minhas mentorias é: “Como consigo dinheiro para começar ou expandir?” Aqui estão caminhos que tenho visto funcionar:
- Linhas de crédito específicas para mulheres (já usei o Banco do Brasil e a Caixa)
- Editais de aceleração com foco em diversidade (participei do BrazilLAB e recomendo)
- Plataformas de financiamento coletivo (vi uma amiga levantar R$50 mil em 15 dias)
- Investidores-anjo sensíveis à questão de gênero (são poucos, mas existem!)
- Fundos como Fundação Elas e WE Ventures (focados em negócios femininos)
Após tentar sem sucesso empréstimos tradicionais para minha expansão, descobri a linha BB Crédito Mulher Empreendedora, que ofereceu condições muito mais acessíveis. O Itaú também possui o Programa Itaú Mulher Empreendedora que vai além do crédito, oferecendo capacitação e networking que fizeram diferença real nos negócios de várias amigas.
Investimento x Retorno: por onde começar?
Quando minhas alunas perguntam quanto precisam para iniciar, sempre compartilho esta tabela que montei com base em casos reais que acompanhei:
Setor | Investimento inicial médio | Tempo estimado de retorno | Lucro mensal aproximado |
---|---|---|---|
E-commerce | R$ 5.000 – R$ 20.000 | 8-18 meses | R$ 2.000 – R$ 10.000 |
Serviços de consultoria | R$ 1.000 – R$ 5.000 | 3-6 meses | R$ 3.000 – R$ 15.000 |
Alimentação (delivery) | R$ 10.000 – R$ 30.000 | 10-24 meses | R$ 3.000 – R$ 12.000 |
Beleza e estética | R$ 5.000 – R$ 50.000 | 12-24 meses | R$ 3.500 – R$ 15.000 |
Educação e cursos online | R$ 3.000 – R$ 15.000 | 6-12 meses | R$ 2.500 – R$ 20.000 |
Lembro-me da minha primeira aluna, Roberta, que começou vendendo brigadeiros gourmet com apenas R$700 de investimento em 2020. “Peguei dinheiro emprestado com minha irmã, comprei ingredientes e embalagens bonitas. Em três meses já tinha pagado o empréstimo e hoje tenho uma loja física”, me contou orgulhosa no nosso último encontro.
Histórias reais que me inspiram diariamente
Como mentora, tenho o privilégio de acompanhar jornadas incríveis:
Ana começou fazendo bolos na sua cozinha durante a licença-maternidade. Com um investimento inicial de apenas R$800 (usando o dinheiro que guardou do auxílio-maternidade), hoje tem uma confeitaria que emprega cinco mulheres e fatura R$30 mil por mês. Seu diferencial? Criou um clube de assinatura de doces que garante receita recorrente.
Carolina estava cansada de produtos cheios de químicos que irritavam sua pele. Com R$5 mil que tinha guardado, começou a produzir cosméticos naturais em casa. Seu marketing foi todo baseado em educação sobre sustentabilidade no Instagram. Três anos depois, seus produtos estão em lojas físicas de cinco estados brasileiros.
Regina perdeu o emprego aos 45 anos e enfrentou preconceito etário em entrevistas. Decidiu criar uma plataforma online para capacitar mulheres que, como ela, precisavam retornar ao mercado após períodos de afastamento. Com inovação e propósito claro, conseguiu atrair o interesse de uma aceleradora logo no primeiro ano.
Cada vez que recebo mensagens dessas mulheres contando suas conquistas, reafirmo minha crença no poder transformador do empreendedorismo feminino.
Como a tecnologia está democratizando oportunidades
Sempre digo nas minhas palestras: “A internet é a grande equalização de oportunidades para mulheres empreendedoras”. E não é exagero. Tenho visto negócios totalmente digitais prosperarem com investimentos mínimos.
A pesquisa da FGV que cito frequentemente mostra que negócios que incorporam ferramentas digitais crescem, em média, 21% mais rápido. E o melhor: muitas dessas ferramentas são gratuitas ou têm custo baixo.
Estratégias digitais que tenho visto funcionar:
- Presença estratégica no Instagram e TikTok (não basta estar lá)
- Conteúdo relevante e consistente (minha amiga dentista conquista 30 novos pacientes/mês só com seu blog)
- E-mail marketing personalizado (ainda o canal com melhor ROI)
- Micro-influenciadores de nicho (mais eficientes que celebridades)
- SEO básico para ser encontrada nas buscas
Patrícia, uma cliente querida, vendia roupas infantis feitas à mão e estava estagnada. Começamos um canal no YouTube mostrando como suas peças eram produzidas de forma sustentável. Com apenas R$300/mês investidos em equipamento e edição simples, ela multiplicou seu faturamento por 7 em menos de dois anos. O segredo não foi apenas estar online, mas contar uma história autêntica.
Como planejar seu negócio: o que aprendi errando
Depois de quebrar minha primeira empresa por falta de planejamento, criei um roteiro que sempre compartilho:
- Identifique um problema real que você conhece profundamente
- Pesquise se outras pessoas sentem a mesma dor (e pagariam pela solução)
- Conheça quem serão seus clientes – não “todo mundo”
- Desenhe um modelo de negócio que possa crescer
- Liste todos os custos – e depois acrescente 30% (sempre esquecemos algo)
- Defina como as pessoas descobrirão seu negócio
- Estabeleça processos simples desde o início
- Aprenda o básico de fluxo de caixa – sério, isso salva empresas!
- Crie métricas para saber se está no caminho certo
- Planeje sua presença online mesmo que seu negócio seja físico
Uma ferramenta que transformou meu entendimento foi o Canvas de Modelo de Negócio. No início achei complicado, mas depois percebi como organiza o pensamento. O SEBRAE disponibiliza uma versão gratuita para download: Canvas de Modelo de Negócio SEBRAE.
Erros que cometi (e que você pode evitar)
A vulnerabilidade é parte da minha abordagem como mentora. Compartilho abertamente meus maiores tropeços para que outras não caiam nas mesmas armadilhas:
Erro | Consequência que vivi | Como você pode evitar |
---|---|---|
Não separar contas pessoais do negócio | Perdi o controle e quase fali | Abra uma conta PJ logo no início, mesmo que MEI |
Cobrar barato para “ganhar mercado” | Trabalhei muito por um lucro mínimo | Calcule seus custos reais e valorize seu trabalho |
Marketing genérico tentando agradar todos | Gastei dinheiro sem resultados | Defina seu público específico e fale diretamente com ele |
Resistência em pedir ajuda | Perdi tempo e dinheiro aprendendo sozinha | Busque cursos, mentorias e comunidades desde o início |
Estocar demais por insegurança | Capital parado e produtos vencidos | Trabalhe com estoque mínimo e fornecedores confiáveis |
Nunca esqueço quando investi R$15 mil em estoque para minha loja online e descobri, da pior forma possível, que metade dos produtos não tinha demanda. Poderia ter testado com pedidos menores antes.
Comunidades que me transformaram como empreendedora
A solidão do empreendedorismo pode ser devastadora. Encontrar outras mulheres na mesma jornada mudou completamente minha experiência. Recomendo de coração:
- Rede Mulher Empreendedora (onde encontrei minhas primeiras clientes e parceiras)
- Mulheres do Brasil (grupo com foco em políticas públicas e networking)
- Minas Programam (para quem atua ou quer entrar na área de tecnologia)
- WE Ventures (para quem busca investimento)
- Sebrae Delas (eventos e capacitações gratuitas ou de baixo custo)
Quando participei do primeiro evento da Rede Mulher Empreendedora, estava desanimada com meu negócio. Voltei para casa com três novas clientes, uma parceria comercial e, mais importante, a certeza de que não estava sozinha nas minhas lutas.
Para onde caminha o empreendedorismo feminino
Com base no que tenho observado no mercado e nas tendências que acompanho, vejo um futuro promissor:
- Mais fundos de investimento com critérios específicos para negócios liderados por mulheres
- Negócios que combinam presença digital com experiências físicas
- Aumento de empresas com propósito social e ambiental (área onde mulheres já se destacam)
- Fortalecimento do comércio local e sustentável
- Coletivos femininos que compartilham recursos e conhecimento
- Presença crescente de mulheres em setores como fintech, agrotech e healthtech
O relatório do Fórum Econômico Mundial que sempre cito em minhas palestras projeta que negócios femininos com componente tecnológico crescerão a taxas 30% maiores que a média nos próximos anos. É um dado que me enche de esperança – estamos apenas começando.
FAQ – Dúvidas que sempre recebo nas mentorias
Como conseguir crédito quando os bancos tradicionais negam?
Passei por isso três vezes antes de conseguir meu primeiro financiamento. Além dos bancos públicos com linhas específicas para mulheres, recomendo explorar fintechs como Rede Mulher Empreendedora e She Invests, que têm critérios mais justos.
Também vale a pena buscar editais como os da Fundação Grupo Boticário e do Instituto Rede Mulher Empreendedora. Uma aluna minha conseguiu R$30 mil para sua startup de educação após tentar sem sucesso em cinco bancos diferentes.
Como empreender sendo mãe sem enlouquecer?
Essa é uma pergunta que me chega diariamente, como mãe solo de dois filhos. Não existe fórmula mágica, mas algumas práticas me salvaram: estabelecer rotinas claras e limites de horário, envolver a família (minha mãe e até meus filhos ajudam em tarefas simples do negócio), usar tecnologia para automatizar o que for possível, criar um espaço físico dedicado ao trabalho (mesmo que pequeno) e, principalmente, aceitar que alguns dias serão caóticos. O livro “Mãe faz tudo e o empreendedorismo também” da Dani Junco me ajudou muito.
Preciso abrir CNPJ logo no início?
Comecei informal e me arrependi. Hoje sempre aconselho: teste seu produto/serviço rapidamente para validar, mas assim que tiver os primeiros clientes regulares, formalize-se.
O MEI (Microempreendedor Individual) custa cerca de R$66 mensais e traz benefícios imensos: emissão de notas fiscais, separação das finanças pessoais, acesso a crédito empresarial e proteção do seu patrimônio pessoal. Uma ex-aluna perdeu um cliente corporativo de R$5 mil mensais por não ter como emitir nota fiscal – uma lição cara.
Como lidar com o machismo no mundo dos negócios?
Essa é difícil e ainda enfrento isso mesmo após 7 anos empreendendo. Minha estratégia: preparo técnico impecável, domínio completo dos números do meu negócio, construção de uma rede de apoio feminina, documentação de situações problemáticas e, quando possível, busca por mentorias com mulheres que já superaram barreiras semelhantes.
Em uma reunião recente, um potencial investidor só dirigia perguntas ao meu sócio homem, mesmo sendo eu a CEO. Redirecionei educadamente cada pergunta e, ao final, ele percebeu o comportamento. Competência quebra preconceitos.
O futuro é feminino – e empreendedor
Quando comecei minha jornada no empreendedorismo, os obstáculos pareciam intransponíveis. Hoje, olhando para trás, vejo que cada barreira superada me fortaleceu de alguma forma. E vejo o mesmo acontecendo com milhares de mulheres Brasil afora.
O empreendedorismo feminino não é apenas uma tendência de mercado – é uma força transformadora da nossa sociedade. Cada vez que uma mulher abre um negócio bem-sucedido, ela cria um novo modelo de possibilidade para outras ao seu redor.
O que mais me emociona é ver como negócios liderados por mulheres tendem a criar ambientes mais inclusivos, preocupados com impacto social e sustentabilidade. Estamos redefinindo o que significa ter sucesso nos negócios.
Então, se você está considerando empreender – comece. Mesmo que seja pequeno, mesmo que pareça assustador. Trace seu plano, busque apoio em comunidades femininas, aprenda constantemente e dê o primeiro passo.
E adoraria saber: qual é sua ideia de negócio? Compartilhe nos comentários ou entre em contato – quem sabe posso ajudar você a transformá-la em realidade! A jornada do empreendedorismo é desafiadora, mas garanto que vale cada passo do caminho.